Ontem, ao final da tarde, na biblioteca da Casa do Alentejo, em Lisboa, realizou-se um encontro com portugueses que, em Maio e Junho deste ano, fizeram o percurso do comboio trans-siberiano, entre Moscovo e Vladivostok - viagem organizada pela Associação Cultural Rotas Vermelhas, com um programa que se diferenciou do que costuma ser o turismo comercial.
Em nome do Conselho Directivo da Associação Iúri Gagárin, Domingos Mealha começou por evocar o exemplo de Alice Sena Lopes, falecida na véspera, como figura destacada de toda uma geração de dirigentes e activistas da paz, da amizade e da cooperação entre os povos. Esta foi uma linha de acção posta em prática pela associação, para além das vias oficiais (a diplomacia, os negócios...).
Neste espírito da diplomacia popular ou informal, milhares de portugueses visitaram a União Soviética, em viagens organizadas pela Associação Portugal-URSS, desde o período logo após a Revolução de Abril até ao final dos anos 1980.
Lembrou, a propósito, o relato de Joaquim Seabra-Dinis, na revista Paz e Amizade, sobre duas viagens à Sibéria (suplementos publicados no site da associação).
Ainda não foi retomada essa actividade, interrompida com o fim da URSS. Foram recuperadas algumas linhas de contacto e actividade comum, em especial através da agência federal russa que se assume como herdeira da União das Associações Soviéticas de Amizade com os povos dos países estrangeiros, cujo representante em Lisboa, Vladimir Iaroshevski, esteve presente na Casa do Alentejo.
Domingos Mealha lembrou ainda que, há um ano, a tripulação do veleiro (trimarã) Russian Ocean Way, em viagem de circum-navegação desde Julho de 2021 (e actualmente em escala na Argentina) visitou a sede da associação. Na altura, foi assinado um memorando que abre portas à cooperação com a Secção Regional de Tomsk da Sociedade de Geografia da Rússia.
Manuel Gouveia, da Associação Cultural Rotas Vermelhas, assinalou que a viagem não foi feita no comboio turístico, um verdadeiro hotel ferroviário, mas sim em comboios de passageiros, no percurso do trans-siberiano, com paragens em algumas cidades. Assim, foi possível ir apreciando como marcas do socialismo (que não apenas as mais visíveis, em monumentos ou na toponímia) convivem com os fenómenos da nova Rússia capitalista.
A viagem permitiu verificar como este país resiste à caricatura, é uma realidade complexa e rica, de Moscovo a Khabarovsk, de Ekaterinburg a Kazanh, do Lago Baikal a Ulan-Ude ou Vladivostok - o que deixou no grupo a sensação de que valerá a pena voltar.
Em breves intervenções, alguns destes viajantes falaram sobre a surpresa que veio consolidar a magia com que já olhavam para a Sibéria; sobre o fraco efeito das sanções dos EUA e da UE no dia-a-dia das cidades russas (em contraste com as dificuldades dos turistas para, por exemplo, fazerem pagamentos sem cartões bancários); sobre a morfologia urbana e o generalizado respeito pela história, incluindo o período da URSS e, sobretudo, a guerra contra o nazi-fascismo; a diferença entre ver no local a manifestação popular do Dia da Vitória e aquilo que é mostrado na generalidade da comunicação social sobre as comemorações do 9 de Maio na Rússia; e foi deixado o pedido de uma mulher, com quem alguns elementos do grupo falaram em francês: «Digam, no vosso país, que o povo russo ama a paz».
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